“Os
livros são espelhos para olhar e ser olhados, para tocar, para medir e explorar
um mundo que se amplia a cada dia.
A conversação que circula no triângulo
amoroso – filho (a), livro e pai/mãe - vai para além das páginas.
São duas
pessoas que se encontram neste espaço; já são dois olhando um terceiro.
Na
história que a voz do pai/mãe vai contando, uma imagem se liga a outra:
o de
trás com o da frente, o tempo com o espaço,
as palavras com as ilustrações, o
livro com a vida”
Reys
por Wilza Nunes - Collectivus de Leitura
Lemos
antes de escrever ao entender leitura como além da decodificação das letras,
lemos com todos os sentidos; o olhar é um meio de leitura. Alguém não só lê o
outro para atende-lo, mas também para envolve-lo entre palavras, olhares e gestos
e, ao mesmo tempo, para escrever os primeiros textos no fundo de sua memória.
Nesse sentido, pode – se dizer que a criança é um leitor poético ou mais
exatamente, um ouvidor poético desde o começo da vida. A proximidade que temos
com a poesia é muito maior do que imaginamos, se recorrermos às lembranças,
ouviremos a voz e o olhar poético de nossas mães, de nossos cuidadores.
O olhar além de ser a observação e possível avaliação de algo, significa
também uma expressão de quem faz carregada de sentidos e assim fala, mesmo no
silencio. O olhar se comunica, se faz entender; traduz sentimentos,
compreensões.Podemos olhar para nós mesmos,
exercitando a autoanálise, a introspecção, nos convidando á aprendizagem. Olhar
para o que está fora, atento e avaliativo ás pessoas, às informações, às
concepções de mundo, nos ampliando. Receber um olhar, podendo nos causar
prazer, dor, tristeza, raiva, consolo, amor, proteção, de acordo com o
contexto. O olhar é algo misteriosamente complexo, algo metafórico, subjetivo,
não compreensível apenas de modo cientifico.
O olhar poético compõe este vasto e misterioso
universo. E para ativa-lo e experimenta-lo é necessário que nos aproximemos da
poesia cotidiana, assim como da poesia escrita e cantada. Nada mais incrível que encontra– la e aprecia-la.
Na mediação de leitura temos uma tríade inseparável: mediador – livro - ouvinte/leitor
e para o mediador temos elementos inseparáveis: olhar – voz
– afeto – escuta sensível.
Compreender a acuidade destes elementos é inaugurar um triangulo amoroso
entre suas partes: pai/adultos - livro –
filho/crianças , é inaugurar a experiência de olhar para um terceiro, juntos;
uma experiência afetiva de um encontro que flui.
“A criança sai aos poucos da
contemplação de sua mãe para o olhar conjunto, ou seja, para a possibilidade de
olhar uma coisa que “ não é você nem sou
eu”. Nesse triangulo – dois que dividem
a experiência de olhar para um terceiro
- os livros são outra metáfora do espaço conjunto compartilhado: olhar o
livro é passar a olhar a cultura em dueto. A cena de um bebê de oito ou nove
meses que “faz de conta que lê “ um livro de imagens faz pensar no adulto que está
por trás e de quem esse bebê “ roubou” voz, gesto e atitude. Para que essa
criança possa se entreter – se lendo
sozinha, foi necessário que uma figura intima lhe revelasse, não uma e sim
muitas vezes, o truque mágico de como olhar e interpretar os objetos planos e
estáticos pinçados entre as paginas”. (REYES: 2010)
Este encontro da poesia em nós, em
nossas vidas, em nossos sentimentos, nas paisagens, nas relações humanas e como
não dizer na ação de mediar leitura ao ver uma criança maravilhada com a
descoberta de um livro: sua narrativa e imagens, ao vê-la imersa na comunhão
com os pais/mães com a possibilidade de se conhecer e (re)conhecer; apresenta
um caminho de ampliação, aproximação e paixão que dá força à criação poética, a
mediação de leitura é um estouro desta criação. Passamos nosso entusiasmo,
emprestamos nossa voz aos textos de forma envolvida, ultrapassamos barreiras
com o olhar poético, afetivo e sensível.
"A Comunhão que se inaugura nesse
triangulo amoroso talvez explique o que leva a criança a precisar de livros; a
pedir que leiam os mesmos livros muitas vezes e em numerosas ocasiões, a
preferir a leitura compartilhada a qualquer outro passatempo. Quando ela
descobre que ao lado dos livros é possível manter os pais em suspense e eles
ficam literalmente submetidos entre as paginas, sem se distrair em ocupações
adultas, passa a pedir que leiam uma e outra e outra vez. È provável que essa
fascinação prematura pelo livro não provenha apenas do objeto físico ou de suas
ilustrações ou das histórias contadas, mas muito mais da experiência afetiva
que flui e oferece tantas pistas de decifração vital, com muita proximidade.
Esse encantamento que permite reter o eco das vozes mais queridas e abrigar-se
com invólucros de palavras é o que talvez nos torne leitores e o que muitas
vezes nos leve, em diferentes momentos da vida, a querer reviver a experiência
afetiva do encontro.
( REYES:2010).
Vamos
oferecê-la às nossas crianças, jovens e adultos até que percebam a poesia
dentro de si.
Bibliografia:
Reyes, Yolanda; A
casa Imaginaria – Leitura e literatura na primeira infância; São Paulo; Global;
2010
Nenhum comentário:
Postar um comentário